Em conversa com a AGÊNCIA BRASÍLIA, Dioclécio Campos Júnior fala sobre políticas públicas, cuidados e prevenção, a palavra chave de sua gestão à frente da Secretaria da Criança

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09/10/2011 às 03:00, atualizado em 12/05/2016 às 17:48

Foco na primeira infância

Em conversa com a AGÊNCIA BRASÍLIA, Dioclécio Campos Júnior fala sobre políticas públicas, cuidados e prevenção, a palavra chave de sua gestão à frente da Secretaria da Criança

Por


. Foto: Pedro Ventura

Dalila Góes, da Agência Brasília

“A criminalidade e o uso de drogas, coisas que acontecem cada vez mais cedo, são um dos sintomas da falta de investimento neste período de zero a seis anos. Digo mais: é uma doença social. E para doença há dois caminhos: tratar e prevenir.”
Dioclécio Campos Júnior Secretário de Estado da Criança

Prevenção é a palavra chave da primeira secretaria brasileira totalmente dedicada à infância. Criada no Distrito Federal, a Secretaria do Estado da Criança também responde pela administração dos centros socioeducativos, conselhos tutelares e Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente, áreas que antes pertenciam à Secretaria de Justiça. À frente da Pasta, o médico e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), Dioclécio Campos Júnior, vibra com o sucesso da primeira grande campanha de sua gestão, a Olho Vivo, que alerta pais, responsáveis e educadores sobre os perigos dos acidentes que hoje são as principais causas de morte na faixa etária de zero a 14 anos.

A secretaria planeja o lançamento de mais um grande projeto: o de Desenvolvimento Integral da Infância e da Adolescência. A ideia é acompanhar os pequenos até os seis anos, idade que, segundo o secretário, é chave no desenvolvimento infantil e qualidade de vida.

É sobre a importância de uma secretária específica para a infância e suas políticas públicas que o secretário Dioclécio Campos Júnior conversa com a AGÊNCIA BRASÍLIA.

O senhor é o primeiro secretário desta Pasta. Já é possível fazer uma avaliação?

Esta secretaria é um marco fundamental e referência em política pública para a infância no país. Há a necessidade de se inverter o investimento, que hoje, no Brasil, está muito mais concentrado na terceira idade. Veja bem, não estou dizendo que as políticas para os idosos não sejam necessárias, mas destaco a visibilidade deste governo em ter um órgão voltado exclusivamente às crianças. O Brasil ainda é um aprendiz neste setor. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) tem apenas 21 anos – a Lei 8.069, que instituiu o ECA, é de 13 de julho de 1990. Esta secretaria também tem a responsabilidade de responder pelas medidas socioeducativas para os adolescentes em conflito com a lei, além dos conselhos tutelares, instâncias cruciais para as medidas de proteção. Se formos avaliar, é uma dimensão enorme que, particularmente, eu prezo e preservo com uma política de prevenção.

O conceito “infância” abrange que faixa etária?

Pelo ECA ela vai de zero aos 12 anos de idade. Mas há a primeira infância, que é quando o cérebro é formado, que vai de zero até seis anos. Já os adolescentes, estão na faixa dos 12 anos aos 18.

E o que é mais problemático, ou preocupante, nestes três níveis de idade?

Uma coisa é certa: o que eu, você e qualquer outro adulto é, ou será, foi plantado na primeira infância, até os seis anos. O resto vem de uma adaptação ao meio, de uma expansão das características montadas neste período. Isso é demonstrado cientificamente com muita clareza. A falta de investimentos, não só de educação e de saúde, mas também de um ambiente familiar seguro e saudável, com estimulação afetiva, levam a desequilíbrios emocionais e de estresse permanentes. A partir daí o comportamento da criança e do adolescente será de outra natureza. A criminalidade e o uso de drogas, coisas que acontecem cada vez mais cedo, são um dos sintomas da falta de investimento neste período de zero a seis anos. Digo mais: é uma doença social. E para doença há dois caminhos: tratar e prevenir. O tratamento é caro, às vezes dá certo, mas deixa sequelas. O que resolve é a prevenção. Temos que trabalhar na formação, no crescimento e no desenvolvimento. O que estou dizendo não é sonho, romantismo ou “achismo”. É evidência científica.

Mas tudo isso também passa por uma mudança de mentalidade, não?

Sim, das famílias, da sociedade, dos governos, de todo o mundo. Felizmente em Brasília já estamos trabalhando. Há a qualificação das medidas socioeducativas e dos conselhos tutelares, que recebemos em estado de total abandono. É um escândalo o que as administrações anteriores fizeram, ignoraram as unidades de internação. Para esta doença temos o projeto de Desenvolvimento Integral da Infância e da Adolescência. Em termos práticos, vamos garantir às novas gerações um cuidado pleno que começará na gestação. Veja bem: não é só o pré-natal. É também um apoio, um acompanhamento com orientação sobre coisas aparentemente simples, como o significado da maternidade. É importantíssima esta fase de interação da mãe com o feto em formação. Depois disso haverá um acompanhamento continuado nos espaços onde a criança for cuidada, como as creches ou em outros espaços semelhantes. Essas crianças serão avaliadas de acordo com o calendário internacional de desenvolvimento neuro psicomotor e social que funciona como um calendário de vacinação.

E como funcionará? Quem fará esse acompanhamento? Haverá apoio de outras secretarias?

Haverá uma equipe multiprofissonal que se deslocará até os locais onde estão as crianças. A partir da constatação de um desvio de desenvolvimento e crescimento, teremos uma identificação e correção de causa. Contamos com o apoio das secretarias de Saúde e de Educação.

E o programa Olho Vivo, que acabou de ser lançado, foi bem recebido?

Esta é a primeira ação concreta que sintetiza as políticas públicas da infância da nossa secretaria e que têm, essencialmente, a natureza preventiva. Hoje os acidentes são a maior causa de mortalidade na infância. No Distrito Federal, em 2010, foram 235 óbitos. No Brasil, foram mais de 5 mil. Para este número de óbitos no Brasil, foram cerca de 110 mil hospitalizações com causas somente por acidentes que, provavelmente, deixarão sequelas para o resto da vida.

Quais são estes acidentes?

Em primeiro lugar estão as quedas e depois os afogamentos. É importante lembrar que as crianças não caem somente quando correm ou andam. Elas caem de janelas, ou porque subiram em algum lugar alto para pegar um brinquedo, e também porque gostam de pular de cima de cadeiras ou do sofá para a poltrona, por exemplo. Quem tem criança em casa sabe bem do que estou falando. Já o afogamento, além das categorias piscina e lago, incluem banheiras, baldes e bacias para o banho. As queimaduras, que são a terceira causa de acidentes, também são terríveis. Sem falar na sufocação. Os pais devem ficar atentos, porque as estruturas de uma criança pequena são diferentes, e as vias respiratórias são bem pequenas. A primeira coisa que uma criança faz ao encontrar um brinquedo ou objeto é levá-lo à boca. Daí é fácil aspirar e sufocar. Outra causa comum são as intoxicações. Isso acontece com os medicamentos que os adultos tomam e que ficam acessíveis às crianças. Os cuidadores e responsáveis devem entender que a criança também reproduz o comportamento do adulto. Pode não parecer, mas é muito interessante e bonito, do ponto de vista dos pequenos, ver um adulto tomar um comprimido e depois a água. Além disso, há uma infinidade de produtos tóxicos, como os produtos de limpeza, que estão à mão. Aliás, o local de maior risco em uma casa é a cozinha. Lá está o fogo, a panela com o cabo virado para fora, as facas… criança pequena não precisa passear na cozinha.

Os acidentes de trânsito também contribuem para este número?

Claro. É uma causa importante que se deve em grande parte ao fato da sociedade não ter incorporado que é preciso transportar as crianças de forma segura. E também há os atropelamentos. Criança pequena não pode andar na rua sozinha. É preciso segurar na mão, por mais que ela chore e resmungue. O menor descuido e a meninada corre para a pista. Senhores pais, as crianças são naturalmente hiperativas e não têm noção de risco.

Como as escolas podem ajudar na prevenção de acidentes?

Vamos levar a campanha Olho Vivo às escolas públicas de Brasília. Se houver interesse da rede particular, os palestrantes e orientadores também estão à disposição. Basta ligar. Os professores são parte importante nesta cadeia de informações. As crianças também, porque reproduzem em casa o que aprenderam em sala de aula. Este é um direito fundamental da infância: um ambiente seguro para o crescimento e o desenvolvimento. Na campanha também há uma cartilha de prevenção de acidentes, com linguagem bem acessível, que mostra quais os cuidados os adultos devem ter. Vamos para a segunda edição deste material, que pode ser retirado não só nas escolas, mas também em postos de saúde e hospital públicos.

E as políticas públicas para os adolescentes?

O adolescente está em uma fase de transformações físicas, neurológicas, psicomotoras e sociais e também precisa de acompanhamento para chegar à vida adulta de forma plena. Quem não teve, digamos, a sorte de ter um bom acompanhamento, uma boa infância, e que está em conflito com a lei, precisa de medidas socioeductivas. São 33 conselhos tutelares no Distrito Federal que acolhem e que fazem os ajustes necessários para uma boa recuperação. Uma coisa que eu gostaria de frisar é que esta Secretaria não trabalha sozinha. Para chegarmos às crianças e aos adolescentes temos muito apoio das secretarias de Cultura, de Trabalho, de Esporte, de Desenvolvimento Social e Transferência de Renda. Hoje no Caje já é desenvolvido um trabalho de qualificação profissional para os adolescentes. São oportunidades em cursos de panificação, artesanato, teatro, por exemplo. Ainda é pouco? É. Mas vamos devagar e já estamos evoluindo para outros centros de internação.