08/06/2024 às 18:52, atualizado em 08/06/2024 às 19:08

Há 18 anos, oficina de mosaico beneficia comunidade do Caps II do Riacho Fundo

Iniciadas em 2006, as atividades oferecem ao usuário o protagonismo a partir da produção da própria arte e da obtenção de retorno financeiro

Por Agência Brasília* | Edição: Chico Neto

O preconceito e a exclusão social são os maiores problemas encontrados por um paciente em tratamento de saúde mental. Isso é o que afirma Emanuel Oliveira, 66, que há seis meses é acolhido pela equipe multiprofissional do Centro de Atenção Psicossocial II (Caps II) do Riacho Fundo.

Emanuel Oliveira frequenta o Caps II do Riacho Fundo: “A verdadeira melhora está nisso aqui: em mostrar para si mesmo que você é capaz de criar alguma coisa | Fotos: Sandro Araújo/Agência Saúde

Acolhimento também é a palavra que ele utiliza para definir a relação construída com os amigos que encontra na unidade destinada ao atendimento de pessoas com sofrimento mental grave, incluindo aquele decorrente do uso de álcool e outras drogas, em situações de crise ou nos processos de reabilitação psicossocial. 

“Só em pensar que eu posso vir para cá, participar das atividades, encontrar com essas pessoas… isso já me transforma”, relata. “Tem vezes em que a gente vem mais para receber um abraço, um carinho. Aqui a gente se sente em família.”

Ele e cerca de outros 30 pacientes participam da oficina de mosaico oferecida há 18 anos no Caps II de Riacho Fundo. São dois encontros semanais – às terças-feiras, de 14h às 17h, e às sextas-feiras, de 9h às 11h30. Ao longo de todo esse período, já foram mais de dois mil beneficiados pela atividade. A arte decorativa, que consiste em criar figuras com pequenos fragmentos de materiais, além de oferecer benefícios terapêuticos, favorece também a geração de renda e o incentivo ao mercado de trabalho.

Recomeço

“Às vezes você se sente como um lixo. A oficina de mosaico começou dessa raiz: daquilo que parecia lixo, a transformação em arte”

Cássia Maria Garcia, técnica em enfermagem do Caps II do Riacho Fundo

As atividades tiveram início em maio de 2006, em meio ao clamor da reforma psiquiátrica e da subsequente criação de unidades do Caps em todo o país. A técnica em enfermagem Cássia Maria Garcia, que atua há 22 anos no Caps II do Riacho Fundo e coordena as atividades do grupo de artesanato desde a sua proposição, lembra que o projeto levou mais de um ano para ser implementado. A busca por materiais e ferramentas que pudessem ser adquiridos e manuseados pelos pacientes da unidade foi cuidadosa.

O grupo encontrou no lixo e em restos de construção a matéria-prima para o exercício artístico e a inspiração para o bem-estar psicossocial. “Quando vem o transtorno mental, um dos primeiros sinais é o isolamento”, pontua a profissional. “Às vezes você se sente como um lixo. A oficina de mosaico começou dessa raiz: daquilo que parecia lixo, a transformação em arte”.

Confeccionadas a partir de pedaços de madeira, cacos de azulejo, cola e rejunte, as peças expostas em eventos e feiras de artesanato do DF se destacam pela riqueza de detalhes. Dezenas de unidades são adquiridas ou encomendadas por apreciadores em cada uma das ocasiões. Muitos dos pacientes ingressaram no grupo sem perspectiva de emprego e hoje obtêm renda do artesanato que aprenderam a produzir na oficina.

Protagonismo

Após determinado estágio da formação, os participantes são orientados à obtenção da Carteira Nacional do Artesão, concedida pela Secretaria de Turismo do DF (Setur). O protagonismo vislumbrado da produção da própria arte e da obtenção do retorno financeiro também serve de combustível para a terapia.

Cacos de azulejo, pedaços de madeira, cola e rejunte se transformam em peças que resultam da criatividade das pessoas atendidas

“O tratamento não é só resultado de remédio”, assegura Emanuel Oliveira, autor de obras e sempre disposto a ajudar os colegas a comercializarem seus trabalhos. “A verdadeira melhora está nisso aqui: em mostrar para si mesmo que você é capaz de criar alguma coisa.”

O Caps é um serviço especializado de saúde mental de caráter aberto e comunitário, ou seja, inserido na comunidade e funcionando em regime de porta aberta, sem necessidade de agendamento prévio ou encaminhamento para ser acolhido.

As atividades podem ser coletivas ou individuais. Após acolhimento inicial e avaliação da equipe, o cuidado nesses espaços é desenvolvido por meio de um projeto terapêutico singular (PTS) que envolve equipe, usuário e família. O cidadão deve procurar, prioritariamente, o Caps de sua região.

*Com informações da Secretaria de Saúde