Nos últimos 21 meses, 1,3 tonelada de canetas emagrecedoras usadas foi parar no lixo reciclável do Distrito Federal. O material, que deveria ser entregue em unidades de saúde ou farmácias, tem sido recolhido pelo Serviço de Limpeza Urbana (SLU) junto a outros resíduos domésticos. Em 2024, 781 quilos foram coletados pelo sistema e, somente até setembro deste ano, mais meia tonelada foi descartada de forma errada, o equivalente a 36 mil unidades de medicamentos aplicados com agulhas. O descarte incorreto desses produtos preocupa o Governo do Distrito Federal (GDF) e já provocou acidentes com garis e cooperados, expostos diariamente a esse tipo de risco.
A Resolução nº 222/2018 da Anvisa classifica esses itens como resíduos perfurocortantes, que exigem destinação especial. A Secretaria de Saúde (SES-DF) informa que possui empresa contratada para o recolhimento e a incineração dos resíduos, em conformidade com as normas sanitárias.
Risco aos trabalhadores da limpeza
De janeiro a agosto de 2025, o SLU registrou 98 acidentes com garis provocados por materiais perfurocortantes, número que já corresponde a 77% do total de 2024. De acordo com o órgão, deve ocorrer aumento de até 15% nos acidentes em relação ao ano anterior.
Segundo a diretora técnica do SLU, Andreia Almeida, os trabalhadores contam com Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), mas o risco permanece. “Os EPIs ajudam, mas não são indestrutíveis. Quando ocorre um corte, o trabalhador é levado à unidade de saúde e precisa iniciar o protocolo de profilaxia contra HIV e hepatites. É um processo pesado, tanto físico quanto emocional”, explica.
Acidentes
O caso mais recente aconteceu no dia 31 de outubro, em uma usina de reciclagem do Distrito Federal. A cooperada Geane Francisca Lima, 42 anos, se feriu ao manusear uma caneta emagrecedora que havia sido descartada junto aos recicláveis. “Ela ficou presa na minha luva e no meu dedo. Doeu muito, sangrou na hora”, contou. Geane, que trabalha há três anos na cooperativa, foi encaminhada ao Hospital Regional do Guará, onde iniciou o tratamento preventivo contra infecções virais. “Tomei o coquetel e estou tomando por 30 dias. Fiquei com medo, porque a gente nunca sabe o que pode ter naquela agulha”, relatou.
Mesmo com a recomendação médica de afastamento, ela voltou ao trabalho no dia seguinte. “O médico queria me dar atestado, mas eu ganho por diária, então se eu faltar eu perco. Minha mão inchou, ficou roxa, mas voltei. É importante que as pessoas tenham consciência, porque um dia de trabalho perdido é prejuízo para a gente, e o risco de pegar uma doença é muito grande”, completou.
A cooperada também faz um apelo à população. “As pessoas precisam pensar no outro antes de jogar esse tipo de coisa no lixo. Um dia de trabalho perdido é prejuízo pra gente, e o risco é enorme. A gente pode pegar uma doença, um vírus, uma bactéria, qualquer coisa grave. É só levar numa farmácia ou numa UBS (Unidade Básica de Saúde). Não custa nada”, disse.
O presidente da cooperativa, Janilson Santana Andrade, explica que o risco é recorrente e pede mais atenção da população. “A gente pede para os moradores do Distrito Federal terem cuidado com seringas, vidros e canetas emagrecedoras. Têm chegado muitas canetas emagrecedoras junto dos recicláveis”, afirma.
Presidente de outra cooperativa parceira do SLU, Vantuil Costa confirma que o material é frequente. “Essas canetas chegam quase todo dia. Às vezes, vêm de três a cinco quilos de uma vez. Mesmo usando luvas reforçadas, os cooperados correm risco. Quando alguém se fura, precisa ir ao posto e tomar a medicação preventiva. Por isso, a gente faz um apelo para que as pessoas descartem de forma correta, levando às farmácias ou UBSs (unidades básicas de saúde)”, alerta.