HCB comemora sucesso nos transplantes de medula óssea em pacientes com anemia falciforme
A anemia falciforme é uma doença hereditária provocada por um defeito genético que acarreta alteração nos glóbulos vermelhos. Assim, eles ganham formato de foice, daí a expressão falciforme. O Hospital da Criança de Brasília José Alencar (HCB), realiza pesquisas e aconselhamento genético de familiares de pacientes com a doença. O projeto foi incorporado na rotina do laboratório de biologia molecular da instituição. No laboratório são feitos os testes para o diagnóstico confirmatório de várias doenças, como a anemia falciforme, identificadas na triagem neonatal, após ampliação do teste do pezinho. Em 2016, foi iniciado um programa de pesquisa no HCB com auxílio da Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAP-DF) e investimentos do Sistema Único de Saúde (SUS), que permitiu o desenvolvimento de uma metodologia que investiga a fenotipagem (diferentes grupos sanguíneos), aumenta a precisão e torna conclusivos os diagnósticos iniciais do teste do pezinho. Estudo da bióloga Larissa Cavalcante pode ajudar na diminuição de casos de anemia falciforme no Brasil e no mundo | Fotos: Divulgação/ HCB Hoje, a maioria das alterações genéticas já pode ser identificada na triagem neonatal. Quando é difícil dizer qual é a alteração genética é que se aplica a metodologia do diagnóstico da investigação por meio da fenotipagem. A bióloga Larissa Cavalcante, do laboratório de pesquisa translacional do HCB, está concluindo o doutorado sobre hemoglobinopatias (doenças encontradas nos glóbulos vermelhos) e o diagnóstico molecular. O projeto de pesquisa dela evita que o paciente chegue à adolescência sem um diagnóstico conclusivo. “A biologia molecular é de suma importância para fazer um diagnóstico confirmatório de doença falciforme, anemia falciforme e outras hemoglobinopatias (doenças genéticas identificadas nos exames do sangue), uma vez que se trata de um problema grave de saúde pública”, pontua Larissa. A pesquisadora diz que, “a partir de um diagnóstico confirmatório de um paciente, pode-se fazer um aconselhamento genético nos casos prevalentes nos casais que têm o traço falcêmico e, assim, pode-se evitar, no Brasil e no mundo, que nasçam novos portadores de doença falciforme”. De 2018 até julho de 2023, foram recebidos pelo HCB, provenientes da triagem neonatal, 323 amostras de pacientes e familiares para o estudo. Excluindo as amostras dos pais, 232 pacientes foram analisados e 80% tiveram os laudos concluídos. Os outros 20% tiveram resultados inconclusivos pelas metodologias adotadas na pesquisa. “O projeto deu muito certo. Hoje, utilizamos não mais como um projeto de pesquisa, ele já foi inserido na rotina do laboratório, então, fazemos um diagnóstico, liberamos o laudo e, o que é o melhor, entregamos um diagnóstico conclusivo, definitivo para o paciente”, comemora a pesquisadora. Daniel de Jesus tem anemia falciforme desde os 9 meses e aguarda o transplante de medula óssea Daniel de Jesus teve o diagnóstico de anemia falciforme aos 9 meses de vida e, desde então, é atendido no Hospital da Criança, onde realiza transfusão de sangue para manutenção. Aos 16 anos, o menino aguarda com ansiedade o dia do transplante de medula óssea, cujo doador será o próprio irmão. “Depois que eu fizer o transplante de medula óssea posso ficar até curado. Estou otimista”, diz Daniel. Qualidade de vida O Programa de Anemia Falciforme do Hospital da Criança mantém 1.499 pacientes registrados ー 894 estão em acompanhamento e 61 fazem regularmente transfusão de sangue. Outros 49 pacientes fazem terapia quelante para sobrecarga de ferro. O HCB realizou com sucesso 8 transplantes de medula óssea em pacientes com a doença e todos seguem sem manifestação de retorno da enfermidade. Além disso, 383 pacientes já fazem uso do medicamento Hidroxiuréia, que tem apresentado excelentes resultados. A médica hematopediatra e diretora técnica do HCB, Isis Magalhães, diz que a Hidroxiuréia assegura qualidade de vida aos portadores da doença. “A Hidroxiuréia aumenta a hemoglobina fetal e diminui os sintomas da anemia falciforme”. “Nós, aqui no HCB, já fazemos uso há muito tempo e, agora, os estudos demonstram que pode-se iniciar o mais cedo possível” Isis Magalhães, diretora técnica do HCB O Ministério da Saúde disponibiliza o remédio depois de incluir na política de assistência farmacêutica. “Nós, aqui no HCB, já fazemos uso há muito tempo e, agora, os estudos demonstram que pode-se iniciar o mais cedo possível. Uma portaria do Ministério da Saúde recomenda que se adote a medicação desde os nove meses de idade, antes da criança apresentar alterações no quadro de saúde”, comenta a pediatra. Luana Corrêa dos Santos, 45 anos, fonoaudióloga, tem doença falciforme e faz tratamentos com Hidroxiuréia. Ela conseguiu diminuir, consideravelmente, as dores. “Aos 9 meses de vida fui identificada com a doença e, desde o início, o prognóstico era difícil”, diz. “Cresci com a realidade de que ia morrer a cada cinco anos, cresci com as complicações da doença falciforme. Tive necrose do quadril, crises de dores na infância, recebi muitas transfusões de sangue. Meus pais buscaram muita ajuda nos tratamentos, mas, tudo mudou quando fui encaminhada ao SUS, em 2010, e passei a usar Hidroxiuréia. Praticamente mudou a minha vida, não sinto mais tantas dores. Consegui até concluir meu mestrado”, conta a fonoaudióloga. O Hospital da Criança também tem adotado como procedimento no acompanhamento dos pacientes, o doppler transcraniano. “Foi uma grande aquisição e a indicação se baseia num estudo que faz uma previsibilidade de risco de um acidente vascular isquêmico (AVCI) encefálico na criança. Esse exame verifica a velocidade de fluxo sanguíneo da artéria cerebral média. Nas crianças que apresentam um exame anormal, repetimos um mês depois e, se persistir a anormalidade, esses pacientes são incluídos no programa de transfusão de sangue de forma regular. É uma profilaxia primária do AVC que realizamos desde os dois anos de vida das crianças inscritas no programa de AF e, anualmente, repetimos esse exame”, conclui a médica. Cura Isis Magalhães ressalta que a anemia falciforme já apresenta índices de cura com o transplante de medula óssea (TMO). “Nós já começamos a executar esses transplantes aqui no Hospital da Criança de Brasília, e estamos com 8 crianças transplantadas, todas estão muito bem e sem a doença. Nós já podemos falar em cura”, adianta. Em 2015, foi criada uma portaria do Ministério da Saúde que, reformulada em 2018, previu o transplante de medula óssea alogênico (de doador), e permitiu a inclusão na tabela do SUS dos critérios a serem observados para o transplante de medula óssea em pacientes com doença falciforme. Elvis Silva Magalhães foi um dos primeiros pacientes no país com anemia falciforme a passar por um transplante de medula óssea, há 19 anos. Em conjunto com representantes da sociedade, orquestrou uma campanha para viabilizar o transplante em pacientes como ele. Elvis Silva Magalhães conta a própria história no livro de crônicas Quatro Décadas da Lua Minguante A história de Elvis virou o livro Quatro Décadas da Lua Minguante, em que narra a própria trajetória por meio de crônicas. De forma delicada, o autor fala da vida até comemorar a cura da doença, aos 38 anos de idade, depois do transplante de medula óssea. “Quando eu transplantei, fiquei livre de todos os sintomas. Hoje estou curado. Antes do teste do pezinho as crianças morriam sem que os pais soubessem o motivo. Agora, quando as crianças são diagnosticadas, imediatamente são encaminhadas ao Hospital da Criança e os pais orientados a observar os sintomas de risco”, aponta Elvis Magalhães. *Com informações do HCB
Ler mais...
Criança diagnosticada com síndrome grave reage bem a transplante de medula
O Hospital da Criança de Brasília José Alencar (HCB) realizou o primeiro transplante de medula óssea para tratamento de criança diagnosticada, ainda na triagem neonatal, com a síndrome da imunodeficiência combinada grave (Scid, na sigla em inglês). Miguel de Sousa foi encaminhado ao HCB depois que o hospital recebeu o resultado do teste do pezinho do menino e, aos três meses de idade, ele passou pelo procedimento. A confirmação de que o organismo aceitou o novo órgão se deu quase um mês após o transplante, realizado em novembro. O pequeno Miguel com os pais, Francisco e Nara, e o irmão, Pedro: família comemora o procedimento bem-sucedido| Foto: Divulgação/HCB Morador do Riacho Fundo, Miguel nasceu no Hospital Materno Infantil de Brasília (Hmib) em agosto e passou pela coleta do exame de triagem neonatal. Uma vez identificada a Scid, o HCB entrou em contato com os pais da criança, Nara Rodrigues e Francisco Fagner de Sousa. “Ele nasceu superbem, fiquei até impressionada; ele era todo esperto, com o peso bom”, conta a mãe do menino. O procedimento “Recebemos essa criança em nosso serviço de imunologia e encaminhamos ao nosso Laboratório de Pesquisa Translacional, que tem a capacidade para fazer o exame confirmatório”, relata a alergista e imunologista Cláudia Valente, do HCB. “Com o resultado, acionamos a equipe do transplante de medula óssea, que é o tratamento indicado em casos dessa síndrome.” [Olho texto=”Antes do transplante, Miguel precisou passar por uma quimioterapia, abrindo espaço no organismo para a nova medula” assinatura=”” esquerda_direita_centro=”direita”] A notícia do diagnóstico preocupou a família. “Fiquei muito mal e comecei a pesquisar, porque eu nunca tinha ouvido falar disso”, lembra Nara. “Ficamos internados, ele recebeu imunoglobulina e cortaram a amamentação”. Em outubro, após um período de tratamento ambulatorial, o bebê precisou ser internado. A família – Miguel tem um irmão mais velho, Pedro, de 8 anos – passou por testes de compatibilidade para doar a medula, e o pai foi o escolhido. “Fiquei feliz demais em poder doar”, conta Francisco. “Desde o início eu já falava que, se todos fôssemos compatíveis da mesma forma, eu é que doaria”. Para ser submetido ao transplante, Miguel precisou passar por quimioterapia. “O tratamento serve para matar a medula dele, que não produz linfócitos, abrindo o espaço para a outra medula”, explica a coordenadora de transplantes de medula óssea do HCB, Simone Franco. Imunodeficiência A síndrome da imunodeficiência combinada grave é uma doença genética em que há alteração dos linfócitos (grupo de células que faz parte do sistema de defesa do organismo), de modo que a criança não produz anticorpos e fica sem imunidade. “O bebê fica bem por um período, enquanto ainda tem células de defesa da mãe, mas o tempo ótimo do transplante é de até três meses”, lembra Cláudia Valente. “Sem isso, ele passa por infecções gravíssimas, meningite, septicemia – se não for transplantado, vem a óbito”. [Olho texto=”“A equipe verificava se Miguel teria febre ou diarreia, mas ele não teve nada disso, nenhuma intercorrência – ele está sempre sorrindo” ” assinatura=”Nara Rodrigues, mãe de Miguel” esquerda_direita_centro=”esquerda”] No caso de Miguel, a detecção da doença ainda no teste do pezinho foi decisiva. “Na primeira consulta, o pessoal da oncologia falou que, como ele estava saudável e descobriram a doença com ele muito novo, havia muitas chances de dar tudo certo”, relata Francisco. Enquanto o filho mais novo passava pela quimioterapia, o pai ficou em casa cuidando do mais velho, que só via o irmão por videochamadas. Os profissionais do Hospital da Criança de Brasília coletaram a medula de Francisco e a infundiram no bebê. Depois, o menino seguiu internado. “A equipe verificava se Miguel teria febre ou diarreia, mas ele não teve nada disso, nenhuma intercorrência – ele está sempre sorrindo”, conta Nara, que seguiu acompanhando o filho até a confirmação de que medula não foi rejeitada pelo organismo. “O irmão dele estava ansioso. Na primeira vez que ele foi internado, quando chegamos do hospital, o Pedro até chorou. Ele ama o irmão”. Cuidados pós-transplante [Relacionadas esquerda_direita_centro=”direita”] Miguel seguirá em isolamento, em casa, até que possa tomar vacinas. “Por mais ou menos seis meses, não vamos receber visitas; também precisamos de máscaras e vamos evitar, ao máximo, sair”, conta Nara. O bebê seguirá acompanhado pelo HCB durante um ano, de forma ambulatorial. Já a equipe de imunologia do hospital o acompanhará até que ele atinja a idade em que será transferido para o atendimento de adultos. “Acho que agora é questão de tempo para poder abraçar, apertar, beijar, porque não pude fazer nada disso”, afirma Nara. Francisco já espera o momento de ver o filho em uma vida comum, como as outras crianças: “Quero levar ele para todo canto, para ele brincar, se sujar, até para brigar com o irmão e eu precisar repreender. Quero que ele tenha uma infância feliz, como eu tive”. Teste do pezinho A síndrome da imunodeficiência combinada grave foi incluída na triagem neonatal este ano, quando o teste do pezinho passou por ampliação – além da Scid, mais de 50 outras doenças podem ser detectadas pelo teste. Miguel foi o primeiro bebê com a síndrome a receber o diagnóstico pela triagem. [Olho texto=”Em 2020, o HCB recebeu autorização especial do Ministério da Saúde para fazer um transplante de medula em uma criança de 10 meses” assinatura=”” esquerda_direita_centro=”esquerda”] Após o teste do pezinho, feito pelo SUS, e a coleta do exame no Hmib, o material foi analisado pelo Hospital de Apoio de Brasília, que logo informou o HCB – referência pública para o tratamento nesse caso. A diretora técnica do HCB, Isis Magalhães, ressalta “o pioneirismo da Secretaria de Saúde de colocar, no teste do pezinho, uma doença em que as crianças, quando não diagnosticadas precocemente, têm expectativa de morte precoce, por infecção”. A médica Simone Franco, por sua vez, explica o impacto de um diagnóstico tão precoce para o tratamento da Scid: “É uma criança sem tantas comorbidades, sem ter contraído várias infecções. A triagem neonatal nos possibilita fazer o transplante em uma criança que ainda não teve manifestação da imunossupressão grave que eles apresentam; isso é importante para a melhora da sobrevida”. Embora seja o primeiro caso de Scid detectado na triagem neonatal, essa não é a primeira vez que o HCB executa um transplante de medula óssea para tratar essa síndrome. Em 2020, o hospital recebeu uma autorização especial do Ministério da Saúde para que o procedimento fosse realizado – na ocasião, tratava-se de um menino de 10 meses de idade. *Com informações do HCB
Ler mais...